Debate envolvendo nanotecnologia, inteligência artificial e a convenção de Singapura é tema de evento no Mês da Advocacia
24/08/2020 14:00h

A mediação tem sido um método cada vez mais utilizado pelos profissionais do Direito, e também uma área cada vez mais estudada e aperfeiçoada a fim de que, através da resolução de conflitos, seja evitada a judicialização de processos. Nesse sentido, a Comissão Especial de Mediação e Práticas Restaurativas da OAB/RS (CEMPR) organizou a "Conferência Internacional: O futuro da medição”, na noite da quarta-feira (19), integrando a programação de eventos online do Mês da Advocacia.
Abrindo o evento, que contou com mais de 600 inscritos, o presidente da CEMPR, Ricardo Dornelles, destacou a antecipação do futuro tecnológico e virtual com a chegada da pandemia e a importância de ser discutido o futuro da mediação neste âmbito: "Este é o nosso segundo evento dentro do Mês, o primeiro fizemos junto com o Poder Judiciário, fazendo uma avaliação da mediação dentro do Judiciário brasileiro e gaúcho, mas o nosso foco, enquanto OAB, tem sido a mediação privada, dando acesso e esclarecendo os advogados para que possam orientar seus clientes quanto às opções de utilização deste método, falando do sistema multiportas. Com este evento, então, buscamos trazer ainda mais esclarecimentos e contando com a visão de especialistas".
O moderador do evento, o vice-presidente acadêmico da CEMPR, Juliano Alves Lopes, ressaltou o trabalho realizado pela comissão, principalmente pelo presidente Ricardo Dornelles, levando o conhecimento sobre a prática da mediação à advocacia: "Hoje debateremos os possíveis caminhos para o futuro da mediação e, possivelmente, alguns serão a partir das novas tecnologias. Acredito que esse seja um dos temas mais relevantes do momento, em função da pandemia e do desenvolvimento da mediação, e também a partir dos reflexos e das perspectivas que nos trazem a convenção de Singapura, que é muito recente; e ainda se fala pouco a respeito, mas acredito qur trará consequências em curto, médio e longo prazo". Lopes ainda ressaltou que o evento integra o projeto Advogando na Mediação Agenda 2020, da Comissão.
Na primeira palestra, abordando a questão da relação entre Direito, mediação e as novas tecnologias, o professor do programa de pós-graduação em Direito da faculdade Unisinos, coordenador executivo do mestrado profissional em Direito da empresa e dos negócios, Wilson Engelmann, trouxe um pouco de sua pesquisa de mestrado, que, desde o ano de 2008, já se voltava para a perspectiva das nanotecnologias. Então, recentemente, percebendo que a partir do momento em que o ser humano consegue acessar a Escala Nanométrica, que segundo o professor é a escala que se tem, por exemplo os átomos e as moléculas, também se foi percebido um crescente desenvolvimento das demais tecnologias dentro desta perspectiva, trazida para se relacionar à mediação, abordando a inteligência artificial.
Wilson Engelmann ressaltou que tem se tornado muito usual o acrônimo VUCA, e que, segundo alguns estudiosos, vivemos em um mundo onde as relações estão ligadas às características que formam a sigla, que em inglês é: volatility, uncertainty, complexity e ambiguity (volatilidade, incerteza, complexidade e ambiguidade). "Essas características dão um norte ao futuro da mediação e da advocacia como um todo. Precisamos nos dar conta de que vivemos em um ambiente totalmente volátil, em que temos transformações atuais, transformações em escalas de tipo e volume, temos também a perspectiva de incerteza, que penso ser uma característica importante para nós estudarmos, porque o Direito, em sua perspectiva tradicional sempre esteve baseado na perspectiva da certeza e previsibilidade, e agora falamos em incertezas. Assim como o próprio elemento da ambiguidade, ou seja, hoje temos uma falta de precisão e uma existência de múltiplos significados nas condições que nos rodeiam".
Apresentando um pouco de seus estudos, Engelmann cita o professor da universidade de Oxford, Luciano Floridi, dizendo que "a inteligência artificial não é meramente outra utilidade que precisa ser regulada quando estiver madura, é uma força poderosa que está modelando as nossas vidas, relações e nossos ambientes", relacionando com sua própria área, de nanotecnologia, afirmando que a partir do momento em que o ser humano conseguiu atingir a escala nanométrica, por meio de equipamentos desenvolvidos também pelo ser humano, ele conseguiu desenvolver, com mais potencialidade, algoritmos, softwares e tantos outros sistemas que estão na base da inteligência artificial.
Chamando a atenção para a importância do Direito caminhar para uma perspectiva digital, o palestrante destacou que "uma outra questão muito interessante, trazida pelo professor de Oxford, é sua consideração a respeito da hiperconectividade vivida pelo ser humano, que não ocorre mais ora online, ora offline, mas, como Floridi diz, estamos vivendo "onlife", ou seja, vivendo cada vez mais no que ele chama de infosfera, que é perfeitamente analógico e digital, off line e online ao mesmo tempo". A partir deste pensamento, Engelmann chama a atenção para a necessidade do Direito caminhar do analógico para o digital e menciona outro autor, Klaus Schwab, que fala a respeito de uma quarta revolução industrial.
"Então as nanotecnologias, a inteligência artificial, a impressão 3D, materiais inteligentes, a internet das coisas, eles estariam todos dentro desse contexto da chamada quarta revolução industrial, que possui três características importantes e, com elas, conseguimos relacionar com o acrônimo VUCA que citei. Essas características são destacadas pelo engenheiro e economista alemão, Klaus Schwab, é a velocidade com que as coisas acontecem, ou seja, além de migrarmos do analógico para o digital, estamos migrando de um ritmo linear para um ritmo exponencial, apontando para a segunda característica que é a da amplitude e da profundidade, ou seja, hoje, praticamente todos os segmentos estão sofrendo alterações provocadas pelas novas tecnologias ou pelas tecnologias digitais. E, por fim, o impacto sistêmico. Todo o sistema de um país e o próprio sistema global, está sendo impactado por essa perspectiva das tecnologias digitais e que, de certo modo, regem a nossa caminhada na atualidade", ressaltou o palestrante Wilson Engelmann.
Com relação à pandemia em que estamos vivendo, por conta da COVID-19, o palestrante faz uma análise, em que ressalta o quanto o mundo foi impactado com relação à aceleração do uso das tecnologias, que estavam sendo preparadas, e houve uma aceleração por conta da necessidade. E a partir desta visão, o palestrante cita uma obra recente lançada pelo autor alemão Klaus Schwab, relacionada ao momento de pandemia, em que fala de três novas características deste momento, que seriam: a questão da interdependência, com relação a dependência dos sistemas digitais; a velocidade, que permite a continuidade da vida, mesmo que as pessoas estejam em casa; e o chamado movimento Just in Time, desencadeando sistemas cada vez mais complexos. Engelmann ainda afirma que, em sua visão, não há como o Direito não se preocupar e, cada vez mais, se envolver e construir sua inserção nesse contexto de aceleração temporal tecnológica vivida nesse momento.
A segunda palestra foi realizada pelo mediador, formado pela Universidade de Yale, com ampla experiência em conflitos empresariais que também envolveram a área de tecnologia, Paul Eric Mason, que abordou a Convenção de Singapura, considerada um marco importante para a Mediação. "A Convenção de Singapura, trata-se de um tratado internacional, chamado formalmente de Convenção das Nações Unidas sobre termos e acordos internacionais resultantes de mediação. Esta convenção facilita colocar termos e acordos assinado, como parte de uma mediação de disputas comerciais internacionais", esclareceu Mason.
O mediador também contou a história da Convenção, que levou quatro anos, foi negociada dentro nas Nações Unidas, pela UNCITRAL (Comissão das Nações Unidas para o Direito Comercial Internacional). Esse órgão, pegou a liderança da negociação desta convenção, este órgão tem vários grupos de trabalhos. Na época, os grupos que ficaram responsáveis tinham cerca de 35 países membros desta convenção.
O palestrante falou também sobre o âmbito da cobertura da convenção: "Em primeiro lugar, limitar as disputas comerciais, porém é um termo que está muito amplo na convenção, sendo delimitado como tudo que não está excluído, que são: assuntos relacionados ao consumidor, trabalhista, e família, que são os três excluídos, assim como a mediação judicial. O acordo reconhece que a mediação toma formas diferentes em cada país, sendo assim não tenta mexer nestes mecanismos, ela facilita a execução entre as fronteiras em termos de acordos feitos por mediação de disputas internacionais de comércio, não mexendo com o processo próprio".
Quanto aos benefícios da convenção, o palestrante ressaltou: "A primeira e mais importante é que a convenção terá efeitos, facilitando o comércio internacional, facilitar o fluxo de bens e serviços para dentro e fora do Brasil em vários setores importantes como o agronegócio, por exemplo, todos os setores onde o Brasil tem muita importação e exportação, assegurando que os termos de acordo sejam cumpridos e executados".
Projeto Advogando na Mediação Agenda 2020
O Projeto, explicado pelo vice-presidente acadêmico da CEMPR, Juliano Alves Lopes, e por um dos coordenadores do projeto, junto ao presidente da Comissão, Ricardo Dornelles, e pelos membros consultivos da Comissão, é um amplo programa de conhecimento, em que, além dos cursos de capacitação e de formação, promovidos todos os anos, também contam com um ciclo de eventos, que ocorre sempre às quartas-feiras, intitulados "as quartas da Mediação".
A ideia da Agenda 2020 é a de possibilitar o aprimoramento da advocacia da área da mediação, por meio de um programa que possa integrar, tanto aspectos práticos, quanto teóricos. Permitindo também uma reflexão a respeito de como é possível avançar com o grande objetivo da Comissão, que se refere à promoção de uma cultura não litigiosa para o tratamento de conflitos.
24/08/2020 14:00h